Não tem sentido sentir inveja.
Inveja é emoção jogada fora, atenção desperdiçada.
É tempo inútil. Você sacrificará a sua vida inteira cobiçando o sucesso alheio e desmerecendo as suas competências.
Pense comigo. O que traz felicidade para você não trará necessariamente para o próximo.
Você pode encontrar prazer em tomar café forte, sem açúcar, devagar, aos goles pausados, sentado na mesa, segurando a xícara quente entre as mãos, olhando a paisagem. Já o outro beberica de pé, correndo, sem degustar. Para ele, é apenas um café para acordar, um shot de ânimo; para você, é um café para refletir, um instrumento de bem-estar.
O que o comove talvez não comova o outro. O que lhe agrada não é certo que vai agradar ao outro.
Felicidade é individual. Não tem como emprestar. As pessoas se arrepiam por motivos diferentes e de jeitos particulares.
Talvez você tenha contentamento em arrumar a casa e deixá-la em ordem, com objetos alinhados, à vista. O outro encontra satisfação em acumular as roupas sobre a cama e não se importar com a simetria. Não há como dizer quem é mais feliz. Muito menos existe como ceder a sua felicidade de faxina para quem é despojado.
O que o torna feliz pode tornar o outro triste, e vice-versa. Tem gente que coloca a cabeça para fora da janela do carro na estrada e berra de euforia. Tem gente que acha que isso é perigoso e infantil.
Não há como sentir inveja. Ela é impossível e impraticável, porque a realidade de satisfação é personalizada. Nossos prazeres são customizados pelas experiências. Predomina o valor espiritual acima do material.
Quem perdeu uma avó guardará o escapulário dela como um tesouro e não o trocará por nada no mundo. Já aquele que não atravessou o luto de um ente querido não entenderá o apego a um colar de corda com a imagem de um santo.
A felicidade revela sempre saudade de uma fase da sua jornada ou eco de um encontro marcante. É desenvolvida pela evocação de uma cena confortável que se repete ou se expande no presente. Você vai revivendo o seu gosto de estar no mundo. É um acúmulo de flashbacks e insights.
Querer ser como outro é um desejo postiço, pois você jamais conseguirá abdicar de sua peculiar sensibilidade.
Apesar de uma vida emprestada com luxos e benesses, suas dores continuarão sendo suas dores, seus medos continuarão sendo seus medos, seus arrebatamentos continuarão sendo seus arrebatamentos.
Se assumir uma biografia distinta da sua, por acreditar que ela é mais promissora, ainda a colocará sob os efeitos de sua história afetiva. Ou seja, vai aclimatá-la de acordo com o que é capaz de compreender.
A fórmula de sucesso de uma personalidade não se replica. Cada um possui o que suporta e o que necessita.
O que adianta uma multidão de fãs se o seu maior propósito é se isolar, saborear a paz e não ser incomodado?
Felicidade é roupa feita sob medida, por alfaiataria. Não tem como passar adiante.
Eu acredito, resumindo a existência, que felicidade é simplesmente ter vontade. Tudo o que você realiza com vontade resultará em alegria.
Trabalho com vontade, amor com vontade, amizade com vontade, família com vontade: eis a imunidade completa diante de qualquer inveja.
Fabrício Carpinejar no jornal Zero Hora